Affonso Soares
Estudos conduzidos sob rigorosos critérios de sondagem, observaçao, comparaçao e avaliaçao têm demonstrado os tremendos prejuízos, de diversa natureza, causados à Humanidade pela multiplicidade das línguas usadas na vida internacional dos povos, problema que igualmente se caracteriza pela resistência à adoçao de uma única língua para essas relaçoes internacionais, uma língua que seja efetivamente apta, sob todos os aspectos, para o desempenho de tao grave funçao social.
Uma das partes mais eloqüentemente visíveis desse verdadeiro iceberg é a incapacidade das grandes organizaçoes mundiais superarem o sistema, dispendioso e pouco produtivo, das línguas oficiais e línguas de trabalho, como ocorre, por exemplo, na ONU, UNESCO e UNIAO EUROPÉIA, sempre agravado pela mal disfarçada e injusta saída do uso franco das línguas de naçoes poderosas.
Um dos mais recentes estudos sobre o problema foi realizado em 1990 por Grégoire Maertens, ex-presidente da Associaçao Universal de Esperanto, tomando por base os altos custos financeiros impostos pela multiplicidade de línguas nos 12 Estados-Membros da Comunidade Européia, bem como nos serviços de traduçao e interpretaçao adotados nas diversas instâncias da Uniao Européia, notadamente no Conselho Europeu de Ministros, na Comissao Européia, na Corte Européia e no Parlamento Europeu.
Maertens examinou a questao, considerando os seguintes aspectos:
custos do ensino de línguas estrangeiras;
custos de traduçao e interpretaçao no comércio e na indústria;
custos no turismo e nos veículos de comunicaçao (rádio, televisao, fax, telégrafo, telefone);
custos de traduçao e interpretaçao nas instâncias da Uniao Européia.
Estabelecendo relaçoes entre o número de estudantes na Bélgica, o custo do ensino de línguas estrangeiras para esses alunos e a totalidade de alunos na Comunidade Européia, chega-se ao investimento anual de aproximadamente 50 bilhoes de unidades monetárias da Comunidade apenas para o ensino de línguas naquela coletividade multinacional.
No terreno das traduçoes e interpretaçoes para as atividades ligadas às relaçoes comerciais, o parâmetro foi o relatório japonês JEIDA (Japan Electronic Industry Development Association), de 1989, por sua vez baseado no americano ALPAC (Automatic Language Processing Advisory Committee), segundo os quais o total de páginas traduzidas para atender às relaçoes comerciais daquele país asiático atingiu a cifra anual de 240 milhoes. Em proporçao, a Comunidade Européia atinge 660 milhoes de páginas. Como o custo de cada página na Comunidade é de 60 unidades monetárias, nele incluídas traduçao, digitaçao, cópias, estocamento e arquivamento, basta multiplicar 60 por 660 milhoes para se obter o custo total do problema lingüístico nas relaçoes comerciais na Comunidade Européia, isto é, a cifra aproximada de 40 bilhoes por ano.
Na área do turismo e das comunicaçoes, os custos nao sao menos consideráveis, pois igualmente se assentam nas necessidades de traduçao e interpretaçao. Além disso, há também prejuízos fora do terreno exclusivamente financeiro: a predominância das línguas mais poderosas impoe tratamento desigual a turistas em funçao de sua pertinência a grupos mais ou menos favorecidos do ponto de vista lingüístico. Apenas para exemplificar um prejuízo fora do campo financeiro na área das comunicaçoes, destacamos a informaçao de que sistematicamente os países com língua nao predominante sao obrigados a alugar programas em língua inglesa, o que fez com que os produtores de filmes na Holanda praticamente renunciassem ao lançamento de filmes em língua holandesa. É fora de dúvida que isso prejudica a cultura em língua holandesa.
No campo dos encontros internacionais, absolutamente indispensáveis para viabilizar intercâmbio cultural, científico, comercial, econômico, etc, o estudo toma como base o documento JIU/REP/80/7, da Joint Inspection Unit, em que foram avaliados os custos e o tempo empregado para se produzir, a partir de um texto em inglês com 25 páginas, traduçoes nas outras línguas de trabalho da ONU (árabe, chinês, francês, alemao, espanhol e russo). Em média, sao necessários 100 dias, à razao de aproximadamente 665 unidades monetárias da Comunidade para as páginas nas outras 6 línguas, ou seja, por 1 página sao gastas 100 unidades monetárias.
Finalmente, os cálculos para o custo da multiplicidade de línguas nas instâncias da Uniao Européia apontam para as seguintes cifras:
Instância Parcela do orçamento Unidades monetárias Parlamento Europeu 37% 155 milhoes Comissao Européia 29% 369 milhoes Cons. Europeu de Ministros 49% 105 milhoes Corte Européia 58% 34 milhoes Outras Instâncias ( 33 milhoes
Em média, portanto, a Uniao Européia utilizou 34% de seu orçamento (= 696 milhoes de unidades monetárias) para as despesas com traduçao e interpretaçao. Mas, em verdade - como concluiu G. Maertens - os custos sao muitíssimo maiores, pois em seu estudo sao abordadas apenas as instâncias com dotaçao orçamentária. Estima-se em 400 milhoes de unidades monetárias o custo em outras instâncias, e ainda se deve somar o custo de 100 milhoes resultante da perda de tempo que o uso das diversas línguas impoe à Organizaçao. Com efeito, a despesa total dos custos do problema lingüístico na Uniao Européia fica em torno de 1,2 bilhoes de unidades monetárias.
Sao cifras assustadoras que vale a pena fixar para se ter a dimensao dos prejuízos que um preconceito pode causar a uma coletividade planetária, como o demonstrou um estudo honesto e bem fundamentado:
12 PAISES DA COMUNIDADE EUROPÉIA GASTAM POR ANO 90 BILHOES DE UNIDADES MONETARIAS PARA SUSTENTAR UM SISTEMA INJUSTO DE COMUNICAÇAO, E O ORGAO QUE REPRESENTA A COMUNIDADE REFLETE ESSA INJUSTIÇA EMPREGANDO 1,2 BILHOES EM SUAS ATIVIDADES INTERNAS E EXTERNAS.
Convém nao perder de vista que o estudo foi feito há dez anos, o que obviamente impoe uma correçao, PARA MAIS, nas cifras acima mencionadas.
As organizaçoes esperantistas do Velho Continente, principalmente as dos países-membros da Comunidade, agem incansavelmente junto às suas instâncias no sentido de conscientizarem representantes sobre a gravidade do problema e sobre o fato de que a soluçao, justa sob todos os pontos de vista, já existe. Mas, como ainda é praxe em nosso mundo, igualmente atrasado sob todos os pontos de vista, levantam-se barreiras até mesmo para o simples exame dessa soluçao, a exemplo do que ocorreu na extinta Liga das Naçoes e se estende à Organizaçao das Naçoes Unidas e a todas as suas ramificaçoes espalhadas pelo mundo.
Nao têm sido outras as reaçoes ao Esperanto: zombaria, indiferença, medo, repressao, sempre nascidas da ignorância, do preconceito, da inércia intelectual e moral, dos interesses e ambiçoes egoísticas, entre tantos outros prejuízos do caráter humano. Mas nao existem obstáculos inexpugnáveis à força do progresso que impulsiona as humanidades para a realizaçao dos destinos a elas assinalados pela Soberana Inteligência que governa o Universo. Os que a essa força se opoem sao inevitavelmente levados de roldao. E o Esperanto inquestionavelmente significa progresso.
Os espíritas nao percamos de vista que nos sao atribuídas graves responsabilidades na construçao da Nova Era em que as sociedades viverao a fase verdadeiramente universalista da evoluçao planetária, unidas acima de todas as acessórias diferenças pelo amor sem fronteiras, pelo trabalho que objetive o bem comum, pela solidariedade nas nobres lutas do aperfeiçoamento, pela tolerância que respeite cada individualidade em suas diferentes expressoes, pela justiça e fraternidade nas relaçoes dos povos. Aí estao, intimamente associados, os ideários da Trilogia que tem sua origem no coraçao do Divino Mestre Jesus: Evangelho, Espiritismo, Esperanto.
Resumo e adaptaçao do texto integral, publicado com o mesmo título no livro LA KOSTOJ DE LA EÖROPA LINGVA (NE-) KOMUNIKADO [Os custos da (nao-) comunicaçao européia], ediçao de "Esperanto" Radikala Asocio, com apoio financeiro da Comunidade Européia. Direitos para adaptaçao e resumo gentilmente cedidos por aquela Associaçao através de e-mail assinado pela Sra. Daniela Giglioli e enviado em 18.11.2000.